14 de julho de 2008

mp3 do dia - deerhunter

deerhunter
Difícil de ouvir, hypado demais, conhecido somente por causa da aparência estranha do vocalista, acometido pela terrível Síndrome de Marfan. Que seja. O Deerhunter será uma daquelas bandas que deixam saudade: provavelmente acabarão cedo demais – por doença, projetos paralelos, shows exaustivos, incompreensão... -, mas já com um arco completo de evolução artística para deixar como legado. Essa é a história por trás de Microcastle.

Bradford Cox foi doutrinado na igreja das texturas e do shoegaze, mas, no início do Deerhunter, escondia sua herança atrás de uma fachada semi-niilista. O primeiro disco deles, Adorno, de 2005, era pós-punk ríspido, interessante, mas um tanto complicado pela complicação.

Dois anos depois, veio Cryptograms, uma audição ainda áspera, que valia a pena especialmente pela sua segunda metade, onde estavam, em sequência, três músicas imaculadas - Spring Hall Convert, Strange Lights e Hazel St -, ao invés do noise e a repetição que as antecedia. A dicotomia entre esses dois blocos era literal - o disco foi gravado em dois momentos distintos, a segunda parte sendo a mais recente. Estava claro que Cox começara a aceitar a sua essência.

Levou meses, e não anos, para confirmar as suspeitas. O EP Fluorescent Grey, lançado meses depois, e o disco do Atlas Sound, projeto-solo de Cox - que contava com duas das músicas mais belas de sua carreira, Recent Bedroom e River Card - eram o começo da resolução de toda a promessa perdida nos discos anteriores.

Finalmente, em Microcastle, todas as faixas são músicas, no sentido mais estrito do termo, com vocais, introduções claras e todo o resto do aparato pop. Mas isso não destitui o Deerhunter do seu valor; fascina enxergar o que eles podem fazer com texturas e melodias dentro da limitada estética de uma canção convencional. Cada uma tem a sua identidade, como uma espécie de impressão digital que se revela, nos fones de ouvido, em sulcos e saliências sonoros; tramas invisíveis, de confecção inimaginável, mas tácteis como veludo, camurça e seda

Trata-se do disco perfeito, com as melodias que logo agradam na primeira audição, e a displicente riqueza sonora e de referências que torna a repetição gratificante, ao invés de enfadonha. É música relevante, sem subgêneros ou termos mirabolantes. Qualquer outra descrição seria dispensável, mera auto-indulgência.

É para tentar propagar bandas assim que fiz esse blog.


[MP3: deerhunter - nothing ever happened]


[MP3: deerhunter - little kids]


[MP3: deerhunter - intro + agoraphobia] (juntei as duas faixas)


[MP3: deerhunter - these hands]

Uma tangente (ainda mais) pessoal
Somos todos idiotas. Vivemos de acordo com aparências e primeiras impressões, enquanto existe alguém como Cox, quase um monstro para os nossos olhos fúteis, mas que tem um todo um universo dentro de si, tão belo, lírico, e cheio da matéria com a qual se cria arte dessa delicadeza. Aquelas lições de moral do Gorpo, no final do He-Man, voltam à tona, contundentes como nunca.

Um comentário:

Sheila Araújo disse...

Lindo, FÊ...
Adorei!!!!
Beijinhos.
She.