Poderia existir uma banda como o Melt-Banana em qualquer outro país que não fosse o Japão? Que outra cultura reuniria a disciplina para conseguir tocar instrumentos em velocidades interestelares e a pura esquitice artística capaz de conceber músicas com barulhos cósmicos, ruídos de noise, tempo de grindcore e passagens kitsch? O impacto sonoro do Melt-Banana gera o mesmo misto de estranheza e genialidade que acomete um ocidental ao jogar Katamari Damacy, a mesma incompreensão (e admiração) do processo mental e criativo por trás da obra. A cultura japonesa condiciona atalhos mentais que nem ao menos vislumbramos.
E cabe mencionar que uma turminha conceituada do lado de cá admira a maluquice: o Melt-Banana já tocou com John Zorn (como Cobra Melt Banana) e Merzbow (como Merz-Banana), gravou com Jim O'Rourke e Steve Albini, e apresentou-se, ao vivo, no lendário programa do John Peel. Enquanto o ouvinte mais comum provavelmente apertaria o stop ao ouvir o primeiro pio ultra-agudo da vocalista Yasuko, alguns percebem que, em meio à realidade cartunesca do som da banda, uma voz de hiena cheirada faz completo sentido.
Bambi's Dillema (2007), o novo disco de uma longa e absurdamente produtiva carreira, começa com um Melt-Banana ainda insistindo em seus recentes experimentos pop (de acordo com a estética deturpada deles, claro) do Cell-scape (2005). É desse segmento que vem Blank Page of the Blind, uma música, na medida do possível, surpreendentemente acessível. Mas a banda também joga um osso para os fãs mais antigos com uma segunda metade de puro noise, com 7 músicas comprimidas em pouco mais de 6 minutos, todas com apenas voz, bateria e um espástico teremim (!!!), fora os latidos de Dog Song.
No final das contas, provavelmente a música do Melt-Banana não te agradará. Mas pode ter certeza de que, no mínimo, terá sido uma experiência válida para a sua vida, como o choque cultural de um intercâmbio de um ano, resumido em um minuto e meio.
[MP3: melt-banana - blank page of the blind]
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